quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Projeto Vida

(13 de novembro de 2001)

Não resta nada a dizer se a lembrança daquele tempo já se foi. O tempo em que se podia ser diferente sem despertar a atenção. Os monstros que haviam eram tão importantes quanto os pais. Os brinquedos eram tão importantes quanto a comida. E quando não havia o brinquedo, havia a imaginação, que já não há. E se há, é fraca.

A fada que era sonho, o castelo faz de conta, sempre existiram. Os heróis eram tão fortes que nada os derrubava, nem o grito da mamãe. Papai era um deles. O maior de todos os heróis. Os monstros do quarto só saiam quando papai entrava. E podia-se dormir tranqüilo. Podia-se sonhar e ter o que era sonho. Os amigos que vieram, e que foram os primeiros, faziam parte destes sonhos. Tinham medo dos mesmos monstros. E eram salvos por seus heróis. Tudo era festa. Até a comida que se transformava em qualquer coisa: matéria-prima para inocente arte. Duplamente arte. Pois era um "arteiro" e era um artista.

Nos rabiscos via-se o mundo. Via-se o universo. Ou um simples sol. Um sol amarelo, um sol azul, um sol verde. Um sol de todas as cores. Uma casinha, uma árvore, talvez algumas flores em volta da casa. E isso era tudo o que se desejava ter no futuro. Não se pensava em ter dinheiro. Tampouco ser o melhor. E muito menos fazer o mal. Só se pensava em ter uma casinha, perto de uma árvore, com algumas flores, onde o sol fosse bem visível. Um pequeno grande projeto de vida ainda no papel.

Mas o tempo não fica parado. Anda devagar, mas sempre anda. E esse projeto foi esquecido. Outros vão tomando seu lugar. Projetos dos mais variados tipos, fins, gêneros, causas e desvantagens. Projetos mais caros, mais devastadores, mais ambiciosos, menos importantes. A criança agora é homem, luta por dinheiro, por amor, por felicidade. Sem saber que a felicidade não é motivo de luta. Já a tem quem se contenta com a vida que tem. Mas esse homem não mais brinca, não mais sonha, nem o medo dos monstros existe. E esse medo que sumiu faz falta. Pois agora o homem se acha valente, o melhor, invencível. Cria guerras, destrói a natureza, mata o próprio irmão. Acaba com a própria vida. Faz todo o possível para não perder poder. E que poder é esse? Mais valioso que a vida. Que poder é esse? Onde não se pode ser humano. Com esse poder não se pode viver.

O homem cometeu tantos erros, que nem se lembra quais foram. Fez tanto mal, que nem sabe mais o que é bem. E aquele projeto de anos atrás já nem existe. Ficou no papel. E é apenas disso que o homem precisa. Uma casinha, com algumas flores, uma árvore e um sol para brilhar. É somente isso, algo tão simples para o homem ter uma vida, realmente vida. Mas ele não enxerga. E o que faz é cometer mais erros, fazer mais mal. Talvez enxergará quando não poder mais viver. Quando sua vida virar morte poderá ver o lastimável erro que cometeu. Quando lutou, matou e destruiu tudo o que podia para realizar projetos desumanos. Só era preciso ser humano, fazer o que estava no papel de criança, realizar o projeto vida.


"Quando o homem voltar a ser criança, o mundo voltará a ser paraíso"
 
 
;-)
 

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